domingo, 31 de agosto de 2008

sexta-feira, 29 de agosto de 2008

Cala-te boca - Greta


Calate - boca,
permaneça aonde estas e
não perturbe o silêncio alheio.

Corta-te boca,
apenas sirva para afogar os
beijos e receios.

Cala-te, corta-te boca,
pois depois do que foi cuspido
o que alivia é a lâmina.

Boca corta-te, cala-te,
e ao mesmo tempo que fere
sinta o que vem rasgando.

Boca desvairada, escancarada e entreaberta,
o melhor é quando
Cala-te, corta-te

e do tanto que dói se auto destrói..

ah, cala-te boca!



quarta-feira, 27 de agosto de 2008

Alegria (Para Drummond) - Fabio Rocha

E eu aqui nesta cidade,
cercado de realidade,
aumentando a minha idade,
alérgico a felicidade,
procuro flores no asfalto.

terça-feira, 26 de agosto de 2008

Trecho de Minha querida - Clarice Lispector


Não pense que a pessoa tem tanta força assim a ponto de levar qualquer espécie de vida e continuar a mesma.
Até cortar os defeitos pode ser perigoso - nunca se sabe qual o defeito que sustenta nosso edifício inteiro…
Há certos momentos em que o primeiro dever a realizar é em relação a si mesmo.
Quase quatro anos me transformaram muito.
Do momento em que me resignei, perdi toda a vivacidade e todo interesse pelas coisas. Você já viu como um touro castrado se transforma em boi. Assim fiquei eu…Para me adaptar ao que era inadaptável, para vencer minhas repulsas e meus sonhos, tive que cortar meus grilhões - cortei em mim a forma que poderia fazer mal aos outros e a mim.
E com isso cortei também a minha força.
Ouça: respeite mesmo o que é ruim em você - respeite sobretudo o que imagina que é ruim em você - não copie uma pessoa ideal, copie você mesma - é esse seu único meio de viver.
Juro por Deus que, se houvesse um céu, uma pessoa que se sacrificou por covardia ia ser punida e iria para um inferno qualquer.
Se é que uma vida morna não é ser punida por essa mesma mornidão. Pegue para você o que lhe pertence, e o que lhe pertence é tudo o que sua vida exige.
Parece uma vida amoral. Mas o que é verdadeiramente imoral é ter desistido de si mesma.

Gostaria mesmo que você me visse e assistisse minha vida sem eu saber. Ver o que pode suceder quando se pactua com a comodidade da alma.

sexta-feira, 15 de agosto de 2008

Poema Desesperado - Torquato Neto

Esta noite abortei as rosas mais vermelhas
que em mim geraram a minha angustia.
Caminhando intranqüilo nesta noite
escarrarei o fel e o fogo que nasceram frutos
do fato verde, azul, oliva, negro
desta figura emoldurada em minha frente.
Desta moldura onde não encontro mais que a coisa semi-aberta
remodelando o barro desta angustia.
Em pretoazulrosavermelho - já sem pouco
o meu escarro há de deixar no imenso rastro
a marca escura desta noite apodrecida.
Transporto a face da pessoa amada
(distante como a rosa esbranquiçada
que plantei na infância em meu jardim perdido)
e aniquilo (já tranqüilo) esta lembrança amarga
dos anos dissolutos e passados.
(descubro agora: neste bar só vendem ausência)

Crianças, esperai! o poeta este perdido dentro da vida
mas há de procurá-las, esperai! há tempo ainda.
É na fogueira acessa deste tempo
que plantarei a rosa e colherei a angustia redobrada,
e me farei em fruto e carne, osso e anzol,
e negarei o fato
e aceitarei o fato.
Esta noite abortarei as rosas mais terríveis,
destilarei em álcool o feto recém - vindo
e alucinado eu brindarei a saúde do meu pranto
e atolarei em verde esta tristeza.

quinta-feira, 7 de agosto de 2008

A História de Lily Braun
Chico Buarque
Composição: Edu Lobo/Chico Buarque

Como num romance
O homem de meus sonhos
Me apareceu no dancing
Era mais um
Só que num relance
Os seus olhos me chuparam
Feito um zoom
Ele me comia
Com aqueles olhos De comer fotografia
Eu disse cheese E de close em close Fui perdendo a pose
E até sorri, feliz

E voltou

Me ofereceu um drinque
Me chamou de anjo azul
Minha visão foi desde então Ficando flou
Como no cinema
Me mandava às vezes-Uma rosa e um poema

Foco de luz

Eu, feito uma gema
Me desmilinguindo toda - Ao som do blues
Abusou do scotch
Disse que meu corpo - Era só dele aquela noite
Eu disse please - Xale no decote
Disparei com as faces Rubras e febris

E voltou

No derradeiro show
Com dez poemas e um buquê
Eu disse adeus - Já vou com os meus-Numa turnê
Disse ele que agora-Só me amava como esposa
Não como star
Me amassou as rosas
Me queimou as fotos
Me beijou no altar

Nunca mais romance

Nunca mais cinema
Nunca mais drinque no dancing
Nunca mais cheese
Nunca uma espelunca
Uma rosa nunca
Nunca mais feliz.

segunda-feira, 4 de agosto de 2008

Não sou eu quem descrevo. Eu sou a tela
E oculta mão colora alguém em mim.
Pus a alma no nexo de perdê-la
E o mu princípio floresceu em fim.

Trecho de Passos da Cruz - Fernando Pessoa